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A ex-diretora de integridade cívica do Facebook, Frances Haugen, 37, prestou depoimento nesta terça-feira (5) aos senadores dos Estados Unidos após uma série de denúncias sobre a forma como a companhia (dona do Instagram e WhatsApp) conduz suas atividades e desenha seu algoritmo para crianças e adolescentes.
O seu testemunho no Capitólio acontece um dia após o apagão global que deixou bilhões de pessoas sem acesso aos sistemas do Facebook, Instagram e WhatsApp. Segundo ela, a empresa é perigosa para a democracia e sabe que seu sistema pode afetar a saúde dos jovens.
"Eu sei que, por mais de cinco horas, o Facebook não foi usado para aprofundar divisões, desestabilizar democracias e fazer meninas e mulheres se sentirem mal com seus corpos", disse Haugen em seu discurso de abertura em uma referência à falha global de ontem.
A identidade da ex-funcionária se tornou conhecida há poucos dias. Neste domingo, ela deu um rosto a uma série de denúncias vazadas à imprensa e à justiça dos Estados Unidos durante entrevista ao programa 60 Minutes, da rede de TV norte-americana CBS. Uma de suas acusações é de que tornar o Facebook mais seguro significa, para a empresa, ter menor lucro.
As preocupações de parte dos parlamentares dos EUA envolvem o fato de que as plataformas do Facebook se tornaram o principal caminho para a desinformação na internet global, bem como sobre a falta de transparência no seu modelo de negócios e riscos de segurança às informações dos seus usuários.
Confira a seguir alguns destaques do que a ex-diretora do Facebook afirmou em seu depoimento.
1. Facebook é perigoso para a democracia
Como já havia dito na entrevista à CBS, Frances Haugen voltou a dizer que a forma como o Facebook conduz suas atividades hoje representa um perigo a seus usuários e à democracia dos EUA.
A principal razão, segundo ela, seria um mecanismo chamado de "ranking de engajamento", pela qual todo conteúdo postado é filtrado antes de ser distribuído na plataforma. Ela diz que o algoritmo da rede social —e também do Instagram— dá mais destaque a posts que promovem mentiras, divisão entre as pessoas e imagens distorcidas de corpos.
Questionada pelos senadores sobre o motivo que leva a empresa a não mudar essas políticas consideradas nocivas, Haugen respondeu que o Facebook não altera seu algoritmo pois tem como objetivo crescer no mercado de redes sociais, sem se preocupar com regras morais. Ou seja, o valor financeiro pesa mais.
"O sistema de ranking de engajamento do Facebook está literalmente espalhando violência étnica em lugares como a Etiópia", afirmou a ex-funcionária.
Frances disse ainda que o Facebook desativou um mecanismo de proteção que havia sido utilizado durante a eleição nos EUA. "Eles queriam o crescimento de volta, por isso voltaram aos padrões originais".
2. Zuckerberg sabe e tem controle de tudo
Questionada sobre a responsabilidade de Mark Zuckerberg, fundador e presidente-executivo do Facebook, sobre as decisões à frente da empresa, Haugen afirmou que o bilionário conhece bem sua plataforma e decidiu não agir sobre essas anomalias.
Para ela, a decisão de não fazer nada, em última análise, cabe a Zuckerberg. "A estrutura de ações do Facebook dá a ele o poder de voto final sobre a empresa e sua direção", afirmou aos senadores.
3. Informações perigosas para jovens
No depoimento, a ex-diretora de integridade cívica ressaltou o impacto negativo dos algoritmos da plataforma sobre crianças, especialmente aqueles de até 14 anos.
Segundo Haugen, a empresa tem conhecimento de pelo menos 600 mil jovens e crianças abaixo dessa faixa etária registrados nas redes do Facebook —embora, oficialmente, a companhia diga que proíbe a entrada de crianças— e mantém investimentos em pesquisas de mercado focadas nesse público.
A ex-funcionária destacou que a companhia entende que o ranking de engajamento direciona meninas e meninos na faixa dos 14 anos a conteúdos relacionados a anorexia, por exemplo. O vício no Instagram por parte de crianças e adolescentes também é de conhecimento da empresa, segundo ela.
Frances afirmou aos senadores que o Facebook atua conscientemente para atrair novos usuários jovens e adolescentes, pois sabe que o crescimento e sustentabilidade da empresa depende da atração desse perfil de pessoas.
Questionada, a informante não hesitou em responder qual a rede social do Facebook mais negativa para os adolescentes: o Instagram. "Nela, tudo é sobre comparar corpos e estilos de vida."
Enquanto Frances respondia aos questionamentos no Senado, Andy Stone, porta-voz do Facebook, tuitava. Em uma das publicações, ele disse que a ex-funcionária "não trabalhou com segurança infantil com o Instagram ou participou de pesquisa sobre essas questões".
Disse ainda que ela "não tem conhecimento direto do assunto por conta de seu trabalho no Facebook".
4. Bullying online
Frances tentou explicar aos congressistas presentes que o ambiente em que as crianças são vítimas de bullying hoje é bastante diferente de 20 ou 30 anos atrás por conta das redes sociais.
"Para as crianças que estão no Instagram, o bullying não para quando voltam da escola para casa. Ele as segue em seus quartos. A última coisa que olham antes de ir para a cama é alguém sendo cruel com elas. É também a primeira coisa que elas leem pela manhã. Pense em como isso vai impactar suas vidas no futuro", destacou.
5. Espionagem que falha
Segundo Frances, a empresa trabalha diretamente no rastreamento de contraespionagem de países como China e Irã, mas considera que faltam investimentos em pessoal. Ela mesma afirma ter tido experiência nesse setor dentro da companhia.
"A falta de pessoal nessas operações é uma questão de segurança nacional. Tenho grande preocupação com a forma que o Facebook trata a essa questão hoje."
O que pode ser feito para mudar
A informante fez uma série de recomendações aos senadores sobre como o Facebook poderia melhorar. Por exemplo, que a empresa seja mais transparente sobre como funcionam seus algoritmos, trabalhando em parceria com o Congresso dos EUA e seja submetida a uma agência reguladora.
Também sugeriu que mais pesquisas sejam feitas nas universidades para medir os efeitos nocivos de determinadas implementações, bem como aumentar as atividades de interferência em conteúdos visivelmente perniciosos, como já é feito na plataforma. Contudo, ela se disse contrária a quebra de seu monopólio.
"Tenho medo, pois o Facebook é a internet para uma boa parte do mundo. Se você separar o Facebook e o Instagram, é provável que a maior parte do dinheiro investido em publicidade vá para o Instagram. E o Facebook continuará sendo esse Frankenstein que está colocando vidas em perigo em todo o mundo", completou.
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