Grossas grossuras, com Pedro II, Sarney, Senghor e Ademar de Barros

Grossas grossuras, com Pedro II, Sarney, Senghor e Ademar de Barros

Uma tarde, no Império, enquanto passeava a cavalo, o Imperador Dom Pedro II caiu do cavalo. O Rio se encheu de boatos. O Imperador estava mal, seria internado e, quem sabe, talvez tivesse que ir tratar-se em Lisboa ou Paris. Ainda não havia Incor, Sírio-Libanês etc. 

Os boatos continuaram. O Imperador apareceu na sacada do Paço Imperial apoiado em duas “muletas”. O jornal “Aurora Fluminense”, dirigido por Evaristo da Veiga, nosso bravo patrono, nome da rua onde está hoje o Sindicato dos Jornalistas do Rio, publicou que “o Imperador apareceu na sacada do Paço apoiado em duas “maletas”. No dia seguinte, o “Aurora” consertou: 

– “Ontem, por lamentável equívoco, nosso jornal publicou que o Imperador apareceu na sacada do Paço Imperial apoiado em duas “maletas”. Na verdade, o Imperador estava apoiado em duas mulatas”. 

A emenda ficou pior do que o soneto. 

HOSPITALIZADO – Quando presidente da República, Sarney veio ao Rio e foi xingado por um grupo de brizolistas que quebrou as janelas de um ônibus da Presidência onde ele estava. Na TV Manchete, a jornalista Jacyra Lucas se atrapalhou e disse que ele foi “hospitalizado” em vez de “hostilizado”. 

Com Sarney não foi nem “muleta”, nem “maleta”, nem “mulata”. Foi mesmo a “maleita” do Poder. 

POETA SENGHOR – Negro, alto, elegante, Leopold Senghor (1906-2001) foi o grande herói do Senegal, desde quando colônia francesa. Poeta, teórico da “negritude” e da poesia africana, formado na Sorbonne, professor em Dacar, deputado na Assembleia Nacional da França, em 58 ajudou a fundar o PUA (Partido da Unidade Africana). 

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Liderou a independência do Senegal, prendeu o ditador Mamadou Dia e em 1960 foi o primeiro presidente eleito de seu país. 

Em 1965, Senghor esteve no Brasil como presidente. Ademar de Barros era governador de São Paulo. O programa elaborado pelo Itamaraty previa uma visita ao Estado. Senghor, conhecido por sua cultura, falava diversas línguas, inclusive o português, ficou bem à vontade no Brasil. 

Quando o chefe do cerimonial do Palácio dos Bandeirantes anunciou a presença do visitante, Ademar gritou lá de dentro: 

– Manda o crioulo entrar. 

Senghor ouviu, mas fingiu que ignorava o português e cumprimentou Ademar em francês. Ademar, que também falava várias línguas, continuou com suas irreverências, conversando em francês com o presidente e entremeando a conversa com frases em português: 

– Estou maluco para ver as canelas desse crioulo. Se forem finas e de calcanhar alto, ele é bom de enxada, conforme dizia meu avô na fazenda. 

Ademar levou-o a visitar a cidade, a Assembleia, o Ibirapuera, os cartões de visita. No dia seguinte, foi até o aeroporto de Congonhas, de onde Senghor seguiu para Brasília. Depois, Ademar disse aos jornalistas: 

– Vejam só. Não sei o que esse pretinho veio fazer aqui. Comprar o quê? Assinar o quê? Nem sei onde fica o Senegal. 

Senghor vingou-se. Contou tudo no livro que escreveu sobre o Brasil. 

Foto: Reprodução/Internet.

  SEBASTIAO NERY - Jornalista, Escritor e Colunista da Tribuna da Imprensa, 1968-1979. 

 

 

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Tribuna da Imprensa Digital e é de total responsabilidade de seus idealizadores.

 

Por Jornal da República em 06/05/2021
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