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O ano é 2022, pleno Século XXI, mas os problemas parecem pertencerem ao início do Século XIX, especialmente quando se trata de violência doméstica e questões de abandono, o que requer do poder público ainda mais atenção com nossas crianças e adolescentes e um maior investimento, qualificação e respeito por aqueles que estão na linha de frente do enfrentamento.
E essa função é realizada, conforme previsão legal, pelos Conselhos Tutelares e pelos Conselhos Municipais da Criança e do Adolescente, cada qual dentro de suas atribuições, cabendo, ao Conselho Tutelar, que é órgão permanente e autônomo não jurisdicional, por meio dos conselheiros tutelares, que são cidadãos eleitos em número de cinco, executar as atribuições que lhe são conferidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que, na prática resulta na faculdade de aplicar medidas em relação às crianças, aos pais ou responsáveis, às entidades de atendimento, ao Poder Executivo, à autoridade Judiciária, ao Ministério Público e às suas próprias decisões, zelando pelo cumprimento integral de direito e garantir absoluta prioridade na efetivação de direitos, orientando na construção da política municipal de atendimento.
Em suma, compete ao Conselho Tutelar atender queixas, reclamações, reivindicações e solicitações feitas pelas crianças, adolescentes, famílias, comunidades e cidadãos; exercer as funções de escutar, orientar, aconselhar, encaminhar e acompanhar os casos; aplicar as medidas protetivas pertinentes a cada caso; fazer requisições de serviços necessários à efetivação do atendimento adequado de cada caso; contribui para o planejamento e a formulação de políticas e planos municipais de atendimento à criança, ao adolescente e às suas famílias.
Por sua vez, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente (CMDCA), cujos membros são eleitos e a composição é paritária entre membros do governo e da sociedade civil, tem por atribuição garantir o direito de participação do cidadão na definição das ações de atendimento às crianças e adolescentes, construindo novas relações entre governo e cidadão, para a corresponsabilidade na construção de políticas públicas adequadas às reais necessidades do município e de cada comunidade no que tange ao tema, acompanhando a execução de programas relacionados nas áreas de saúde, educação, assistência social, trabalho e proteção da criança e do adolescente, garantindo o direito à vida e ao pleno desenvolvimento.
Como se vê, é dever de todos e, principalmente do Estado, zelar pela garantia fundamental de proteção integral das crianças e adolescentes de todos os direitos inerentes à pessoa humana, cabendo ao Conselho Tutelar assegurar-lhes, conforme previsão legal, todas as oportunidades e facilidades, a fim de garantir o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade, a partidos do momento em que seus direitos estejam em situação de violação.
E como consta do próprio artigo 4º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, também é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público, assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, portanto, pode-se afirmar categoricamente que a garantia da proteção integral às crianças e ao adolescentes é dever de todos.
O Conselho Tutelar não integra o Poder Judiciário e nem está de qualquer modo vinculado ou subordinado a este, possuindo, para o cumprimento de suas atribuições, total autonomia funcional, ou seja, quando delibera, toma decisões, age ou aplica medidas, requisita serviços, etc., não necessita de qualquer autorização, devendo, no entanto, agir, nos estritos limites da lei e da Constituição, sendo, por outro lado, no entanto, do ponto de vista administrativo, vinculado ao Município, muitas vezes à Secretaria Municipal de Assistência Social ou de Direitos Humanos, razão pela qual as questões administrativas estão atreladas às decisões e fiscalização do Poder Executivo.
Ocorre que, em muitos Municípios o Conselho Tutelar é apenas uma ficção jurídica, assim como os Conselheiros Tutelares sofrem para conseguir o mínimo de estrutura com vias a efetivação de suas atribuições constitucionais e legais, vez que são mínimas a estrutura colocada à disposição do trabalho a ser desenvolvido, em especial o próprio local de trabalho, que muitas vezes não se tem local próprio, mas, sim, uma “salinha” dentro do prédio da Prefeitura ou prédio anexo, pertencente a estrutura do Poder Executivo, assim como é de total ausência a segurança para o desenvolvimento do mesmo, que muitas das vezes, em razão das condições e do tipo de violência e ambiente, exigem uma atuação de confronto que os deixam em situação de vulnerabilidade sem qualquer amparo.
Inúmeros são os relatos de conselheiros tutelares ameaçados e até mesmo agredidos fisicamente durante o exercício de suas atribuições legais, momento em que, em alguns casos, a única proteção é dos próprios colegas e, talvez, da Guarda Municipal e, em casos mais graves, da Polícia Militar, que precisa ser acionada para garantir a segurança de todos, especialmente das crianças e adolescentes envolvidos na operação, o que demonstra se tratar de uma profissão de risco, que exige acima de tudo disposição e muita entrega pessoal.
Tais condições demonstram o quanto ainda é necessário avançar em direção à efetivação dos direitos e garantias fundamentais, especialmente como ainda é necessário ampliar a visão do gestor para os temas mais sensíveis e importantes que estão colocados sob sua responsabilidade, garantindo àqueles que estão na linha de frente dessa batalha árdua o mínimo de garantias e estrutura para sua efetivação, afinal, não é crível exigir que os Conselheiros Tutelares, na batalha diária de proteção dos direitos das crianças e adolescentes, coloquem a própria vida em risco, sem um mínimo de seguranças e meios para tal.
Para tanto, exige-se do Poder Público, como meio a efetivação de tais direitos, especialmente por se tratar de direitos constitucionais e legais de primeira dimensão, tal como a vida, a integridade e a dignidade humana de seres em desenvolvimento, que dê total prioridade e apoio ao trabalho desenvolvimento pelos Conselhos Tutelares, fornecendo-lhes autonomia financeira, com o mínimo de estrutura funcional, espaço digno de trabalho, remuneração adequada, valorização dos profissionais, equipamentos, veículos e, principalmente, segurança, pois, só assim, será possível assegurar a proteção integral dos direitos humanos de crianças e adolescentes de maneira contínua e ininterrupta, sem interferência externa, como é típico de um órgão de estado permanente e tão importante.
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¹ PEIXOTO, Elísio. Conselhos Municipais. O encontro entre a sociedade civil e o poder público. 1ª ed. AASAS: São Caetano do Sul, 2021.
² https://www.infoescola.com/direito/conselho-tutelar/
³ https://pt.wikipedia.org/wiki/Conselho_Tutelar
? https://crianca.mppr.mp.br/pagina-1834.html
Amilton Augusto
Advogado especialista em Direito Eleitoral e Administrativo. Vice-Presidente da Comissão de Relacionamento com a ALESP da OAB/SP (2019-2021). Membro julgador do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/RJ (2019-2021). Membro fundador da ABRADEP - Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (2015). Membro fundador do Instituto Política Viva. Membro do Conselho Consultivo das Escolas SESI e SENAI - CIESP/FIESP (2019-2022). Coautor da obra coletiva Direito Eleitoral: Temas relevantes - org. Luiz Fux e outros (Juruá,2018). Autor da obra Guia Simplificado Eleições 2020 (CD.G, 2020). Coautor da obra Dicionário Simplificado de Direito Municipal e Eleitoral (Impetus, 2020). Autor da obra “Temas Contemporâneos de Direito Eleitoral e Político (CD.G, 2022). Palestrante e consultor. Contato: https://linktr.ee/dr.amilton
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