Arcabouço Fiscal é aprovado na Câmara dos Deputados

A norma substitui antigo teto de gastos, e tem como principal bandeira reforçar a capacidade do Estado brasileiro em realizar investimentos públicos para desenvolver o país

Arcabouço Fiscal é aprovado na Câmara dos Deputados

O texto-base do novo Arcabouço Fiscal foi aprovado na noite desta terça-feira (23) em plenário da Câmara dos Deputados por 372 votos a favor, 108 contrários e 1 abstenção. Os parlamentares ainda votarão os destaques à matéria. Na abertura da ordem do dia pelo presidente da casa, Arthur Lira (PP-AL), 477 deputados estavam presentes à sessão.

O PLP 93/23 institui regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do país e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico, nos termos da Emenda à Constituição 126. O novo arcabouço fiscal substitui a Emenda Constitucional 95, conhecida como teto de gastos, e tem como principal bandeira reforçar a capacidade do Estado brasileiro em realizar investimentos públicos para desenvolver o país.

Desenhado pelo Ministério da Fazenda em conjunto com o do Planejamento, o projeto é um avanço sobre o teto de gastos que vigorou desde o governo Temer e há consenso na esquerda quanto a isso. É verdade que era um teto de gastos desmoralizado por Bolsonaro, mas ainda é considerado um avanço em relação ao período anterior. No entanto, na comparação histórica, há quem faça a crítica de que é pior do que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de Fernando Henrique Cardoso, sancionada no início do século.

O relator da proposta, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), apresentou o relatório ao público na terça-feira (16) da última semana. Ele atendeu a dois pedidos do presidente Lula e blindou o salário mínimo e o Bolsa Família. No entanto, inseriu uma série de “gatilhos” no texto, ou seja, medidas de correção automática de despesas, caso a meta para as contas públicas não seja cumprida. É justamente isso o que divide opiniões nas esquerdas.

O texto tem apoio do governo Lula. 

Entre os governistas, as opiniões sobre a versão do relator estão divididas. O deputado Carlos Zarattini (PT-SP), em entrevista ao Fórum Onze e Meia, na terça-feira (16), assegurou que o novo arcabouço fiscal seria aprovado.

"Com a queda do preço dos combustíveis, que impacta o índice da inflação e a aprovação da nova lei fiscal que vai ser votada na semana que vem, vamos ter uma mudança. Vai ser aprovada com larga maioria no Congresso Nacional. Vai ser um sucesso", observou uma semana antes da votação.

Já o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) é crítico ao projeto. Na segunda-feira da última semana (15), ele também esteve no Fórum Onze e Meia e comentou que discorda porque quer que o governo Lula dê certo.

Diversas outras alas à esquerda do governo, como o Psol, têm tido dificuldades em engolir a proposta, avaliada como conservadora pelos quadros mais progressistas do congresso. A bancada do Psol inclusive antecipou a tendência de votar contra o novo marco fiscal na votação da última semana sobre o regime de urgência.

Talíria Petrone (RJ), pelas redes sociais, explicou que torce pelo sucesso do governo Lula e que para isso defende a ampliação dos investimentos públicos. "O governo Lula tem que dar certo, e isso significa ampliar os investimentos públicos. Seguimos na base de apoio e na batalha para enterrar o teto de gastos e construir um novo Brasil", escreveu.

Glauber Braga (Psol-RJ) também critica o novo arcabouço fiscal. Para ele, o relatório de Cajado é um pacote de austeridade que incluiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e o piso da enfermagem no "novo teto".

Horas antes da sessão Cajado afirmou a jornalistas que mudaria o trecho do texto que fixava aumento de 2,5% nas despesas em 2024. “O ponto que demandou mais discussão foi em relação a elevação da despesa. Vamos fazer um novo texto. O texto original previa um crescimento de 1,12%, vamos pegar a diferença em cima do que tiver de crescimento e colocar até 2,5%”, afirmou.

Cajado garantiu que irá manter dentro do limite de gastos o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

É justamente esse debate sobre o aumento do orçamento do Estado brasileiro para reforçar sua capacidade de investimentos no país que foi lembrado por dois parlamentares, no mesmo plenário, pouco antes da sessão começar.

“É necessário recuperar a capacidade de investimento do Estado. Essa proposta de arcabouço fiscal não é a que queríamos e que o Brasil necessita, mas é aquilo que é possível. Aliás o governo encaminhou uma proposta que tem sido piorada pelo relator e será apresentada neste plenário. Devemos discutir até o último momento para preservar a capacidade do Estado brasileiro de investir, gerar emprego, renda e combater a fome”, disse Daniel Almeida (PCdoB-BA)

“O projeto tem vários avanços: o primeiro é assegurar um piso mínimo para investimento no setor público, que significam mais de R$ 60 bilhões por ano que podem aumentar conforme aumenta o PIB. Isso vem a corrigir o antigo Teto de Gastos que nos trouxe em 2023 ao menor investimento público da história do país”, disse Mauro Benevides (PDT-CE)

Economistas assinam manifesto para evitar "camisa de força" no governo Lula
Um grupo de 90 economistas e intelectuais ligados à Federação Psol-Rede no Congresso Nacional assinou um manifesto contra o texto final do Arcabouço Fiscal. O objetivo é alertar que a proposta será prejudicial para a implantação das promessas de campanha do Governo Lula e que precisa ser melhorada.

“Não faz sentido que as novas regras fiscais reproduzam argumentos fiscalistas. O Brasil não está prestes a quebrar. Dezenas de países em desenvolvimento mundo afora convivem com déficits fiscais sem que isso represente um bloqueio ao crescimento da economia nacional. Mais que isso: as medidas necessárias à reconstrução do país exigem pesado investimento do setor público, especialmente num momento em que a criminosa política de juros do Banco Central – agora autônomo – torna mais atraente a compra de títulos da dívida pública em detrimento do investimento produtivo. Assim, as novas regras fiscais não podem servir para criar uma camisa de força ao novo governo”, diz um trecho do manifesto.

Entre as medidas incluídas pelo relator, Claudio Cajado (PP/BA), no novo Arcabouço Fiscal - e que o grupo critica - estão a definição de novas punições em caso de não cumprimento das metas de controle dos gastos, que incluem bloqueios para reajuste de servidores e novos concursos públicos.

“Além disso, o relator incluiu o FUNDEB e o piso da enfermagem nos limites fiscais. Para o mercado, quanto mais amarras às políticas sociais, melhor. Impor ao governo sucessivos superávits primários, num momento em que o país mais necessita de investimentos, depois da devastação bolsonarista, é um equívoco grave. É preciso alterar de forma estrutural a proposta formulada pelo relator, obstando que sejam aprovadas medidas que impeçam o cumprimento das promessas de campanha do presidente Lula”, explica um outro trecho do manifesto.

Os autores buscam deixar claro que o texto não é uma posição oficial da bancada, mas uma iniciativa de parlamentares e intelectuais ligados ao Psol e à Rede que avaliam com preocupação as mudanças que o parlamento propôs ao marco fiscal. Para os signatários, é urgente “enfrentar as ofensivas do mercado, que defendem a criminalização da política econômica”.

Em outras palavras, avaliam que caso o risco de travar os investimentos públicos em setores de interesse público se concretize, o governo pode perder popularidade por não entregar promessas de campanha que versam sobre o atendimento de necessidades básicas da população. “Queremos e precisamos que o governo Lula dê certo! Para isso, ele não pode frustrar as expectativas de mudança. Só assim afastaremos de vez o fantasma do retorno da extrema direita ao poder”, finaliza o manifesto. (Da Revista Fórum)

Por Jornal da República em 23/05/2023
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