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Diferente do que muitas pessoas acreditam, a política não é dominada por escolhas racionais. É só analisarmos a conturbada recente eleição no Brasil. Você já deve ter se perguntado, independentemente de sua ideologia política, como “fulano” pode apoiar tal candidato? Na verdade, esses comportamentos não podem ser explicados racionalmente, pois eles são no fundo motivados por componentes emocionais, por mais que as pessoas neguem isso.
Ou seja, as escolhas políticas são baseadas na emoção e depois racionalizadas. E claro, os políticos, de forma intuitiva ou assessorada, sabem disso e usam tal informação de forma estratégica. E aqui que entra o neuromarketing político, que se preocupa em estudar os processos cerebrais conscientes e não conscientes, que explicam a percepção, o comportamento e a tomada de decisão no ambiente político. E, segundo suas teorias, a emoção é o melhor caminho para conquistar eleitores e cidadãos. Por exemplo, quando analisamos a cerimônia de posse do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, podemos enxergar tais estratégias.
Uma das partes mais emocionantes da cerimônia foi a subida da rampa do Planalto por brasileiros comuns, representantes de minorias e até um “pet” para que entregassem a faixa de presidente a Lula. Essa escolha, além de gerar comoção, transmitiu uma importante mensagem: de que o governo terá como foco esses setores da sociedade.
Outro fato interessante e que tem seu fundamento na neurociência se relaciona ao uso das cores. Repetindo o que aconteceu durante a campanha, apesar do vermelho ser a cor relacionada ao PT e ter sido usada massivamente pelos legionários, não foi a escolha do presidente e nem da primeira dama. A ideia é tanto na campanha como na posse minimizar o radicalismo que essa cor representa e assim reforçar a ideia da existência da frente ampla no novo governo.
No seu discurso de posse, Lula reforçou a ideia quando disse que governará para os 215 milhões de brasileiros, e não apenas para quem votou nele. Por outro lado, o vice-presidente Geraldo Alckmin fez uma escolha diferente e optou pela gravata vermelha. Assim como Simone Tebet, que usou um lenço no pescoço com detalhes na cor. Nesse caso, a mensagem passada por ambos é outra: estamos realmente “vestindo a camisa” do novo governo.
Uma outra ferramenta muito utilizada pelo neuromarketing na conquista de consumidores e também presente na política é o storytelling. Segundo a neurociência, as narrativas ajudam na memorização e aumentam o engajamento. Um exemplo foi quando Lula, no seu discurso de posse, contou a história da “caneta” que ganhou de um cidadão depois de um comício na campanha de 1989. A pessoa na época disse para ele guardar aquela caneta para assinar a posse caso ganhasse as eleições. Mas ele não ganhou nesse ano, nem em 1994 e nem 1998. Já em 2002 e 2006, nas duas vezes que foi eleito, esqueceu a tal caneta. Mas recentemente ele a reencontrou e fez questão de assinar a posse com ela. Histórias como essa servem para refletir a identidade e os valores do político e, de forma inconsciente, “mexer” com a emoção das pessoas.
Em resumo, a retórica emocional é muito eficaz na política, principalmente quando o simbolismo ou as metáforas são utilizadas. Contudo, como sempre alerto, para essas estratégias perdurarem a médio e longo prazo, assim como ocorre no ambiente comercial, o “produto” precisa ser realmente bom. E esse será o grande desafio do novo governo: provar que será um “bom produto”. Quase metade dos eleitores fez outra escolha nas urnas e uma grande parte do Congresso e do Senado não são aliados. Enfim, o desafio é grande, mas a torcida também deve ser. A sociedade e o País agradecem.
*Shirlei Camargo é mestre e doutora em Marketing pela UFPR, com formação em Design e especialização na FAE Business School. Também é mestranda em Neuromarketing na Escuela Superior de Comunicación y Marketing (ESCO), na Espanha.
Sobre a Professora Shirlei Camargo – Reconhecida pela excelência acadêmica e atuação no mercado profissional, a Professora Shirlei Camargo conta com habilidades que a diferenciam ao aliar conhecimentos da ciência do marketing e empreendedorismo. É mestre e doutora em Marketing pela UFPR, com formação em Design e especialização na FAE Business School. Também atua como palestrante e consultora, estabelecendo pontes entre as mais diversas abordagens para o mercado consumidor. Atualmente, ministra aulas junto aos cursos de Administração e Ciências Contábeis da UFPR, faz mestrado em Neuromarketing na Escuela Superior de Comunicación y Marketing (ESCO), da Espanha, e foi professora do Centro Universitário Internacional (Uninter). Publica artigos científicos e para imprensa e, entre seus trabalhos acadêmicos, foi premiado pela Emerald Literati Awards de 2019. É coautora dos livros “Introdução ao Neuromarketing: desvendando o cérebro do consumidor”, “O cidadão é rei!: marketing e atendimento em serviços públicos” e “Varejo Digital 5.0”, ambos de 2022. Já passou por empresas como grupo Boticário (previsão de vendas) e Record Internacional (ministrando treinamentos).
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