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A primeira audiência na Câmara dos Deputados com um ministro do governo Lula (PT) foi marcada por bate-boca entre opositores e aliados do Palácio do Planalto.
Flávio Dino (Justiça) foi à CCJ (Comissão de Constituição de Justiça) da Casa, negou omissão das forças federais nos ataques golpistas de 8 de janeiro e acusou bolsonaristas de disseminarem fake news sobre sua visita ao Complexo da Maré (RJ).
Uma das principais razões de desavença foi a decisão de Dino de acusar deputados e senadores bolsonaristas ao STF (Supremo Tribunal Federal) pela divulgação de falsidades associando sua ida à Maré a um suposto envolvimento com grupos criminosos.
Um dos alvos do processo, o deputado federal Carlos Jordy (PL-RJ) afirmou que Dino não poderia apresentar notícia-crime contra parlamentares.
“A Constituição diz que deputados e senadores são invioláveis, penal e civilmente, por quaisquer de suas palavras, opiniões e votos. Eu queria saber do ministro qual o entendimento da palavra ‘quaisquer’. Não há exceção”, disse.
Em resposta, Dino afirmou que a imunidade parlamentar não é um “direito absoluto”, como reconhecido pelo STF.
“A imunidade parlamentar não é escudo para o cometimento de crime nem camisa de força para maluquice. É um instituto constitucional, e eu preciso lidar com carinho para que ele seja preservado”, completou.
Durante a audiência, deputados da base e da oposição protagonizaram uma série de discussões. O principal embate ocorreu após fala do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que tentou repreender Dino por respostas irônicas que havia dado a parlamentares.
“O senhor tem que tratar essa comissão com respeito, sem deboche ou sorrisinho de canto, porque aqui não tem palhaço nem circo e a gente precisa ter respeito com o Parlamento”, afirmou o deputado. Em resposta, ouviu gritos de “moleque”, “peruca”, “palhaço” e “chupetinha”.
Nikolas é alvo de representações no Conselho de Ética da Câmara por fazer discurso transfóbico no plenário da Câmara, vestindo uma peruca, no Dia Internacional das Mulheres.
Deputados da oposição disseram considerar o ministro desrespeitoso ao responder a uma pergunta do deputado André Fernandes (PL-CE), que o acusou falsamente de responder a mais de 200 processos na Justiça, segundo pesquisa que o parlamentar disse ter feito em um site jurídico.
O ministro recorreu ao deboche para responder às acusações do parlamentar. “Deputado da CCJ dizer que pesquisou no Jusbrasil: eu vou contar para os meus alunos como anedota, como piada. O senhor acaba de entrar no meu livro de memórias”, disse o ministro, que explicou que o sistema de buscas do site identifica registros de candidaturas e prestação de contas à Justiça Eleitoral, entre outros resultados.
“Dizer com base no Jusbrasil que eu respondo a processos se insere no mesmo continente mental de quem acha que a Terra é plana”, completou.
Em resposta, o deputado André Fernandes, investigado em inquérito no STF por incitar os atos de vandalismo em 8 de janeiro, pediu “respeito”. “O ministro não está em campanha aqui, não.”
O ministro também usou de ironia ao dizer que não teria problema em voltar outras vezes à Câmara para discutir assuntos relacionados ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.
“Não tenho medo do embate: um momento como este, para mim, é um alento na alma. Quem quiser me ver feliz, me chame aqui toda semana, porque estou realmente encantado com a possibilidade de conhecer as senhoras e os senhores. É um aprendizado para mim — eu, estudioso da alma humana e que tenho a tarefa de 28 anos de dar aula de direito”, afirmou.
Durante a audiência, Dino ainda afirmou que o governo federal não foi omisso nos ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro. Ele disse que manteve contato com os governadores Cláudio Castro (Rio de Janeiro), Tarcísio Freitas (São Paulo) e Ibaneis Rocha (Distrito Federal), na véspera dos atos, para pedir atenção às manifestações bolsonaristas.
“No caso de Brasília, é público e notório, o próprio Ibaneis já disse: disseram uma coisa para ele e ocorreu outra coisa […] A Polícia Militar do Distrito Federal, infelizmente, não cumpriu aquilo que estava escrito no planejamento operacional da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal”, disse.
Após o fim da sessão, o ministro da Justiça afirmou que a Câmara precisa reavaliar a utilização dos convites e convocações de membros do Executivo diante da improdutividade da audiência, com perguntas repetidas e bate-bocas entre parlamentares.
“As audiências servem para que o ministro possa falar de sua área. Infelizmente, há pessoas que tentam desrespeitar o regimento interno e acabam conduzindo a situações que fragilizam o Congresso Nacional”, disse.
“Durante algumas horas, eu mostrei que em relação aos três itens do convite não havia rigorosamente nada. Tanto é que, após minha primeira explanação, todas as demais falas mudaram de assunto e virou um debate geral de governo e oposição”, completou.
Dino foi alvo de pedidos de convocações e convite em diversas comissões da Câmara. A maioria foi protocolada por deputados bolsonaristas nas comissões de Segurança Pública e de Fiscalização e Controle.
O governo, porém, desenvolveu uma estratégia própria para chamar o ministro a prestar esclarecimentos antes na CCJ, cujo presidente é o deputado federal Rui Falcão (PT-SP).
Antes da sessão desta terça, parlamentares da base do governo se reuniram na sala da presidência da CCJ para definir uma estratégia para blindar Dino durante a audiência.
O plano, segundo relatos de participantes do encontro, envolveu obstruir a sessão quando a tropa bolsonarista subir o tom e inscrever o máximo de deputados aliados ao Planalto para falar, utilizando todo o tempo regimental para reduzir a atuação da oposição.
Dino foi convocado para explicar uma série de fatos envolvendo o Ministério da Justiça e Segurança Pública no início do governo Lula.
Os parlamentares perguntaram sobre a atuação da pasta nos ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro, o decreto que limitou o acesso da população a armas e a visita de Dino ao Complexo da Maré.
Na véspera da audiência, Dino ainda bloqueou o perfil do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) em uma rede social. O caso reacendeu as críticas de bolsonaristas ao ministro.
Da Agenda do Poder com informações da Folha de São Paulo.
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