Ibama dá licença à ExxonMobil e acende alerta para poluição de petróleo na foz do São Francisco

Ibama dá licença à ExxonMobil e acende alerta para poluição de petróleo na foz do São Francisco

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedeu à multinacional norte-americana ExxonMobil autorização para iniciar a exploração de petróleo no litoral brasileiro, entre Alagoas e Sergipe, próximo ao estuário do rio São Francisco. 

O empreendimento é alvo de críticas de pesquisadores e moradores, por oferecer risco de contaminação a 52 Unidades de Conservação (UCs), afetando a biodiversidade e prejudicando comunidades que tiram seu sustento da natureza.

A Licença de Operação (LO) - última etapa do processo de licenciamento - foi concedida na quarta-feira (16) e tem validade de cinco anos. Na prática, significa que o Ibama atestou o cumprimento de medidas de mitigação de impactos ambientais por parte da empresa. 

 autorização é assinada pelo presidente do órgão Eduardo Bim, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e notório defensor do relaxamento de normas ambientais em processos de licenciamento.

Risco de contaminação 

O projeto consiste na perfuração de 11 poços de petróleo no trecho entre Alagoas e Sergipe. A área onde pode haver impactos indiretos, no entanto, vai até o Rio de Janeiro. Pelo projeto, a perfuração mais próxima ficará a 50 quilômetros da costa.  

"Esse óleo pode chegar a mais de 15 quilômetros continente adentro, entrando nas cidades de Brejo Grande (SE), Piaçabuçu (AL), chegando próximo à divisa com Penedo (AL), dependendo da vazão do São Francisco”, alertou o pesquisador e professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Emerson Soares em reportagem do Brasil de Fato Pernambuco publicada em janeiro deste ano.

Segundo Soares, que atua na região desde 2007, o trecho mais ameaçado é entre Sergipe e Alagoas, onde há desova de tartarugas de cinco espécies, a maioria delas ameaçadas de extinção. “Nós temos também a Área de Proteção Ambiental (APA) de Piaçabuçu, que é uma área prioritária para a pesca."

A produção do Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) do empreendimento é alvo de críticas da Associação Olha o Chico, que atua nos setores de cultura, educação e meio ambiente em Piaçabuçu (AL). Em carta aberta, a entidade afirmou que as populações locais não foram consultadas e apontou “fragilidades” na pesquisa científica.

“Quando a empresa pretende seguir com seu projeto de exploração de petróleo, sem acolher as realidades específicas dos territórios atingidos, sem ouvir as populações impactadas, ela também está desrespeitando um direito garantido por lei que exige que nós povos e comunidades tradicionais sejamos consultadas por meio da Consulta prévia, livre e informada e de boa fé”, escreveu a Associação em uma carta aberta. 

Emerson Soares, da UFAL, também apontou falta de transparência do Ibama e da ExxonMobil, principalmente sobre os impactos do empreendimento junto aos moradores da área afetada. “As informações precisam chegar às comunidades tradicionais de forma mais clara e mais debatida”, afirma.

A população da foz do rio São Francisco ainda se recupera do maior desastre ambiental já registrado na costa brasileira. A partir de agosto de 2019, 5 mil toneladas de petróleo cru começaram a atingir 3 mil quilômetros de litoral, abrangendo as regiões nordeste e sudeste. A investigação responsabilizou o navio petroleiro grego Bouboulina, da Deltankers.

“Em casos de derramamento de petróleo, como o acontecido em 2019, além de prejuízos às águas e às espécies aquáticas, também foram afetadas a saúde humana e a economia local que estão diretamente relacionadas. Este crime segue impune e não houve nenhuma ação do Estado para compensar as comunidades dos impactos sofridos”, diz o comunicado da Olho no Chico. 

Conforme reportou a Agência Pública, a própria ExxonMobil reconheceu o risco de vazamento de material tóxico, quando financiou, sem a autorização do Ibama, o treinamento de populações em municípios de Sergipe e Alagoas para atuarem de maneira emergencial em caso de contaminação. 

A ExxonMobil é a maior detentora de áreas entre operadoras internacionais de petróleo no Brasil, com mais de 10 mil quilômetros quadrados e participação em 28 blocos nas bacias de Campos e Santos.  

No currículo de desastres ambientais provocados pela multinacional está o episódio que entrou para história como “maré negra”, quando o naufrágio de um navio em 1989 espalhou 42 milhões de litros de petróleo no Alasca (EUA), provocando a morte milhares de aves, baleias, lontras marinhas e peixes.

Em 2019, a norte-americana foi considerada a empresa mais poluidora do mundo na produção de plásticos descartáveis, à frente da Dow e da chinesa Sinopec. Segundo o índice Plastic Waste Makers, da Minderoo Foundation, a empresa produziu 5,9 milhões de toneladas de plástico que terminaram no lixo. 

Em nota enviada ao Brasil de Fato Pernambuco em janeiro deste ano, a ExxonMobil afirmou que estava “seguindo as recomendações e protocolos do Ibama” e ressaltou que o projeto fica em alto mar e não no Rio São Francisco.

A multinacional diz se comprometer a "preservar a saúde e a segurança da comunidade e do meio ambiente”. “Neste sentido, informamos que foram promovidas mais de 190 reuniões com representantes das comunidades na área de abrangência do projeto", escreveu. 

Por Jornal da República em 19/02/2022
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