Justiça começa a ouvir testemunhas no processo do envolvimento de Maxwell Simões com os assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes

Justiça começa a ouvir testemunhas no processo do envolvimento de Maxwell Simões com os assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes

O juízo da 4ª Vara Criminal da Capital realizou nesta quarta-feira (10/10) a primeira audiência de instrução no processo em que o ex-bombeiro Maxwell Simões Correa é acusado de envolvimento na morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Além de Maxwell, são acusados do crime os ex-PMs Ronnie Lessa e Elcio Vieira de Queiroz, que estão presos.  

O envolvimento do ex-bombeiro surgiu na delação premiada de Elcio Queiroz. Maxwell teve a prisão preventiva decretada pelo juiz Gustavo Kalil, com base nas provas apresentadas pelo Ministério Público que apontaram a sua ligação direta, antes, durante e depois dos assassinatos. Maxwell está em um presídio federal em Brasília e participou da audiência de forma remota.  

Por videoconferência Elcio Queiroz prestou o seu depoimento, fazendo um relato de toda a dinâmica do assassinato e das providências que ele e demais acusados tomaram para se livrarem do carro Cobalt e de qualquer outro vestígio incriminador pelo duplo homicídio.

Disse ter gratidão a Ronnie Lessa, por ajuda recebida na época em que foram da Polícia Militar. Ele contou que no dia do crime, em 14 de março de 2018, foi convidado por Ronnie Lessa para dirigir um carro e que os dois se encontraram no condomínio do ex-PM, na Barra da Tijuca. Elcio alegou não saber que participaria dos assassinatos. Na sua opinião, Ronnie o convidou por falta de confiança em Maxwel para ser o motorista.  

Ele e Ronnie foram se encontrar com Maxwel, a quem entregaram os celulares para não serem rastreados e de quem receberam o Cobalt. Em seguida, foram para a Lapa, onde ficaram aguardando a vereadora Marielle Franco sair de uma reunião na Casa das Pretas. O crime ocorreu no Estácio, onde os criminosos emparelharam com o carro de Marielle. Com rajadas de metralhadora, Ronnie Lessa atingiu Marielle e Anderson.

Ao ser perguntando porque somente depois de tanto tempo ele resolver fazer a delação premiada, Elcio respondeu que é porque não confiava nos policiais da Delegacia de Homicídios, apenas na Polícia Militar e na Polícia Federal.

A assessora de imprensa de Marielle, Fernanda Gonçalves Chaves, estava a bordo do carro da vereadora, mas não foi atingida pelos disparos. Os criminosos abandonaram o carro na porta da casa da mãe de Ronnie Lessa e foram se encontrar com Maxwell em um bar na Barra da Tijuca.  

No dia seguinte ao crime, os três passaram a engendrar uma forma de se livrarem do carro. Primeiro, trocaram as placas que foram picadas e os pedaços jogados na linha férrea em Quintino, bairro da Zona Norte do Rio. O carro foi entregue a um mecânico de Rocha Miranda, conhecido pelo apelido de Orelha, com a recomendação de ser desmanchado. Segundo o depoente, Maxwell e Ronnie Lessa são sócios na exploração de “gatonet” no Morro do Turco, em Rocha Miranda, e em caça-níqueis.

Ao desconfiar que seria preso, pediu a Ronnie Lessa que mantivesse financeiramente a sua família. Ronnie prometeu que esse sustento viria de Maxwell, com o dinheiro arrecadado no “gatonet”. No primeiro mês, Maxwell cumpriu o prometido, mas depois o dinheiro foi minguando até ser suspendo por completo.
 
 
Viúva de Marielle
 
A audiência reuniu os depoimentos das testemunhas de acusação. Começou com a viúva de Marielle, Mônica Benício, que disse desconhecer se a companheira recebia ameaças por sua atuação na política. Segundo Mônica, que é vereadora, Marielle atuava nas pautas em defesa das mulheres e da juventude negra, especialmente moradores nas favelas. Emocionada, Mônica chorou em seu depoimento.  

Ágatha Arnaus Reis, mulher de Anderson, contou que seu marido trabalhava há dois meses com a então vereadora e nunca comentou haver preocupação com a segurança. E falou sobre o drama pelo qual ainda passa, com a morte do marido e os cuidados com o filho portador de uma doença congênita. O menino deixou de fazer exames necessários para o acompanhamento da doença, por não poder comparar com o DNA do pai.

Fernanda Gonçalves foi a terceira depoente e fez um relato da convivência que mantinha no dia a dia com a parlamentar. Ambas moravam próximas na Tijuca e, às vezes, iam e voltavam juntas do trabalho. No dia do crime, ela estava sentada ao lado de Marielle no banco traseiro do veículo. Fernanda ouviu a rajada de metralhadora e foi atingida por estilhaços de vidro no rosto, mas não viu de onde havia partido. Ao perceber que Marielle e Anderson tinham sido atingidos, saiu do carro e foi socorrida por transeuntes.

A assessora de imprensa disse que a ex-vereadora jamais mencionou ameaças ou se mostrou preocupada com a sua segurança. Contou que, apesar da limitação do cargo, Marielle era crítica com relação a falta de segurança que expunha as pessoas vulneráveis, seja com a atuação das milícias ou da polícia. Ela foi integrante de uma comissão na Câmara que investigou a intervenção federal na segurança ocorrida no Rio de Janeiro.  Após o crime, ela foi obrigada a sair do Rio de Janeiro e hoje vive em outro estado.  

O delegado Giniton Lages afirmou em seu depoimento que nunca havia visto um crime cometido com tamanha complexidade. Falou sobre o vazamento de informações logo no início das investigações, como a imagem do Colbat usado no dia do crime. Contou ainda como a inteligência da polícia conseguiu descobrir quatro datas, em fevereiro de 2018, em que o carro realizou trajetos similares ao feito no dia do crime, o que provava que Marielle já vinha sendo monitorada há algum tempo. O delegado ressaltou que uma denúncia anônima fez com que os investigadores chegassem aos nomes de Ronnie Lessa e Maxwell e que o uso de dados telemáticos, como interceptações telefônicas, confirmou a denúncia de que os dois tinham participação no crime.

O policial civil Carlos Alberto Paul Junior, que participou do grupo que rastreou o veículo, e os policiais federais Guilherme Machado Catramby e Felipe José Sampaio Alves foram os últimos a depor nesta terça-feira.

A continuação a audiência está marcada para o dia 1º de dezembro, quando serão ouvidas as testemunhas de defesa e realizado o interrogatório do réu.
 
Processo 0029021-13.2023.8.19.0001

PC/SF/FS

Por Jornal da República em 12/10/2023
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