O abandono do teto de gastos para a reconstrução da economia brasileira

Por Ricardo Lodi

O abandono do teto de gastos para a reconstrução da economia brasileira

Como de costume, a proximidade das eleições presidenciais no Brasil faz reacender debates econômicos ainda não superados, em especial aqueles relacionados ao papel do Estado na economia.

A miopia do setor financeiro reduz o orçamento público a mero instrumento contábil a serviço da dívida, já a realidade da fila dos ossos pressiona o poder público a tomar ações mais efetivas no contorno da recessão. 

Nesse contexto, até Paulo Guedes foi forçado a reconhecer a inexequibilidade da regra do teto de gastos para ampliação de investimento público no Bolsa Família por ensejo da criação do programa Auxílio Brasil.

Considerando o histórico de austeridade fiscal da agenda econômica executiva, que desde as eleições defende a estagnação do investimento no setor público, parece evidente a intenção política, às vésperas do ano eleitoral.

Esse comportamento não é só típico da velha política, como abre espaço para interpretações rasas de que políticas fiscais expansivas são necessariamente irresponsáveis ou demagogas, dificultando uma análise mais atenta sobre os motivos que, de fato, são relevantes para a deterioração das contas públicas e para o financiamento de direitos sociais. 

Resta mais do que documentado pela economia heterodoxa o fracasso da austeridade fiscal para retomada de crescimento econômico, inclusive no recorte brasileiro do período pós 2015 . A manutenção de estímulos fiscais no decorrer de crises econômicas não é apenas necessária à subsistência de milhões de pessoas como também é encarada como remédio para ciclos econômicos recessivos.

A austeridade fiscal, por sua vez, ignora os efeitos econômicos multiplicadores decorrentes dos investimentos públicos. Com melhor infraestrutura social se induzem novos investimentos, fazendo aquecer a economia e o consumo.

Assim funciona, por exemplo, com o estímulo à saúde pública de qualidade, indispensável à manutenção das vidas e da economia, como visto nessa crise sanitária.

O legado pós-pandemia exige, mais do que nunca, o reconhecimento de que os investimentos públicos merecem destaque nas prioridades orçamentárias do governo, garantindo a renda das pessoas e a estabilidade econômica.

*Ricardo Lodi é reitor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), professor de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da Uerj, presidente da Sociedade Brasileira de Direito Tributário, sócio fundador da Ricardo Lodi Advogados, mestre em Direito Tributário e doutor em Direito e Economia.

Por Jornal da República em 28/01/2022
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