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Evandro Carvalho classificou como "abominável" a intenção da Inglaterra de repetir o feito de Nancy Pelosi indo à Taiwan em ação contra a China: "faz jus ao passado dela"
A visita não autorizada de Nancy Pelosi à província Ilha de Taiwan, bem como a reação e discursos inflamados da diplomacia da China, fizeram a pequena província ganhar as capas de jornais em todo o mundo. Para Evandro Carvalho, o que irá ditar o ritmo da crise a partir de agora é a capacidade chinesa de “continuar com a cabeça fria” e “não entrar nessas provocações”.
Taiwan não é um país independente. Trata-se de uma província chinesa cuja disputa remonta o final da guerra civil chinesa em 1949, quando o Partido Comunista de Mao Zedong vence o Partido Nacionalista de Jiang Jieshi (Chiang Kai-shek), o qual se exilou junto a seus partidários derrotados na Ilha de Taiwan, perdendo o controle continental da China.
Essa situação perdura até hoje por iniciativa do presidente dos EUA, Harry Truman, que em 1950 colocou a sétima frota da marinha no Estreito de Taiwan, dividindo os dois grupos políticos. Em 1971, a ONU reconhece o governo da República Popular da China como representante legítimo de toda a China, contrariando os nacionalistas derrotados em Taiwan.
Em 1979, os EUA repetem esse reconhecimento. Quem nos conta essa história é o doutor em Direito Internacional pela USP e referência em estudos sobre a China da Fundação Getúlio Vargas, Evandro Carvalho.
Para Evandro Carvalho, campanha dos EUA e países da OTAN contra a China não desanimará países que buscam estreitar relações com o BRICS+.
Questionado sobre a intenção de legisladores britânicos de repetir o feito de Pelosi, o especialista disse que seria um “absurdo maior ainda“:
“É preciso dizer com todas as letras: vai fazer jus ao passado da Inglaterra de um país intervencionista. E isso seria um absurdo maior ainda por vir de um país que no século XIX invadiu a China, provocando duas guerras, obrigando os chineses a comprarem ópio. E ainda se achar no direito de intervir nos assuntos chineses em pleno século XXI? Isso é abominável.“
Reunificação pacífica
Para Evandro, existem duas tendências principais hoje em Taiwan: os nacionalistas, que também entendem que existe uma só China, e setores que buscam independência. Este último é o caso do Partido Democrático Progressita (PDP) da atual chefe de governo, Tsai Ing-wen. Mas, para todo efeito, Taiwan não é e nem nunca se declarou independente: “é uma questão de reconhecimento de quem governa toda a China”.
“Os Estados Unidos reconhecem que quem governa toda a China é a China comunista, esse tipo de ação com venda de armamento e treinamentos militares, e no discurso em Taiwan a Nancy Pelosi fala em dois países [se referindo a EUA e Taiwan]. Tudo isso é uma afronta a soberania chinesa.“
O professor em direito internacional afirmou que não acredita em uma saída militar. Para ele, o governo chinês já deu sinais claros de que prefere a reunificação pacífica de Taiwan, chegando a citar o encontro entre Xi Jingping e o nacionalista Ma Ying-jeou, ocorrida em 2015. Na ocasião, Xi Jinping teria dito que “o sangue é mais espesso que a água; somos uma mesma família”.
“Militarização perigosa”
A respeito do atual cenário do Ásia-Pacífico, na qual Austrália e Japão estão em uma curva militarista ascendente muito por influência dos EUA e do Reino Unido, Evandro avalia que há sim o risco de recrudescimento.
“O partido democrata é um partido extremamente armamentista e militarista, que fazem guerras mais do que os republicanos, mas não podemos esquecer que a Europa é a região mais complicada do mundo. Não só pelo seu histórico de invasões e riquezas através de exploração, escravidão e todo o genocídio provocado mundo a fora pela Europa e ter dado cabo a duas guerras mundiais. O problema está aí, quando esse ‘ocidente desenvolvido’ acha por bem defender seus interesses na base da força.”
Evandro destaca o passado “nada abonador” do Japão, mencionando a campanha genocida do império e o Massacre de Nanjing, quando trezentas mil pessoas foram assassinadas “simplesmente do nada, com um objetivo de massacre total”.
Para o pesquisador, o mundo estaria entrando em uma “militarização perigosa”, que seria “reflexo da mudança de estrutura do sistema internacional”. Segundo ele, a força hegemônica dos EUA fará de tudo “para não entregar o pódio”: “é certo que viveremos momentos dramáticos nas próximas décadas”
Campanha contra a China não desanimará BRICS+
Ao final da entrevista, questionamos se essa campanha internacional midiática, econômica e militar antichinesa poderia minar o interesse de países que vem pedindo adesão ao BRICS, como Argélia, Argentina e Irã. Evandro foi enfático: “muito pelo contrário”
“De maneira surpreendente, houve uma pressão por parte dos EUA e dos países da OTAN que todos os outros países entrassem na política de sancionar a Rússia. Alguns países, como o Brasil, condenaram a ação da Rússia mas se recusaram a sancioná-la. Em todo o continente africano, nenhum país sancionou a Rússia. Na América do Sul e Central também não, uma boa parte da Ásia também não. O oriente médio também não. Isso diz muita coisa do que está acontecendo: o ocidente desenvolvido está perdendo a projeção de poder que tinha no século XX.”
Fonte: Por Luan Medeiros - Agência Brasil China
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