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Da Ponte Jornalismo - “Olha a humilhação que estão fazendo com nós, tio, olha como tratam trabalhador!”, grita um homem em um vídeo a que a Ponte teve acesso. As imagens mostram um efetivo de ao menos cinco viaturas do 39º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano sendo usadas contra um homem negro no Jardim Norma, bairro pobre na região de Itaquera, na zona leste da cidade de São Paulo, por volta das 10h desta quinta-feira (14/4).
No vídeo, a vítima das policiais, de cueca, é algemado e colocado de bruços no chão. A pessoa que filma continua: “trabalhador sofrendo na mão da polícia, é tiração”. O homem que está algemado parece semiconsciente e é posto na parte de trás da viatura por dois policiais que o puxam pelos braços.
O homem algemado é o inspetor de alunos Jhonny Alves, 38 anos. Um dos vídeos mostra que ele foi agredido pelos policiais dentro de casa. Segundo ele, a ação começou quando um grupo de PMs abordou seu irmão, Hernani, nas proximidades de casa e o chamou de “neguinho”. Indignado, o irmão de Johnny teria confrontado os PMs reclamando do xingamento racista e dizendo que tinha nome. Em seguida, ele teria fugido e entrado dentro de casa.
Jhonny conta que estava dormindo e ouviu gritos na residência. Ao abrir o portão, deu de cara com dois policiais militares ameaçando invadir a casa. Quando a dupla disse que estava atrás do seu irmão, Jhonny pediu calma e disse que iria buscá-lo, mas os dois PMs teriam dito “dá licença porra nenhuma” e forçado a entrada. “Eles tentaram passar, eu segurei a grade e apareceram mais policiais. Quando eu me dei conta, tomei uma joelhada e começaram a me puxar, me enforcar e eu fui resistindo, tentando ficar dentro do quintal”, relata.
Nesse momento, os policiais tentaram imobilizar Jhonny segurando-o pelo pescoço, o que é proibido pelas normas da corporação desde julho de 2020 — a agressão foi filmada pelo irmão de Jhonny. “Eles foram me arrastando, eu me desequilibrei, caí, bati a cabeça e não vi mais nada. Quando eu acordei, eu já estava no hospital”, diz o inspetor.
No pronto-socorro do hospital Planalto, Johnny afirma que ouviu os policiais comentando que “deveriam ter cancelado o CPF dele” e que teriam exigido mais agilidade dos médicos para que ele fosse levado para “uma nova casa”. “Eu entendi que isso seria a cadeia e, quando eu questionei, um policial olhou e mandou eu ficar quieto. Ali, de fato, eu ofendi ele porque ele já não representava mais a polícia. Xinguei ele”, conta.
O inspetor afirma que ele e o irmão foram levados para o 64º DP (Cidade A.E. Carvalho) e liberados depois. Jhonny relatou à Ponte que tentou diversas vezes durante esta sexta-feira (15) realizar o exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML) de Artur Alvim, na zona leste, mas os funcionários disseram que o local estaria sem sistema. Nas fotos que enviou à reportagem, tiradas na delegacia, é possível ver hematomas no ombro, um corte no dedo do pé e lesões na cabeça, na testa e no rosto.
No boletim de ocorrência, os PMs Claudio Cardoso, Rodrigo Baptista Ferreira e Vitor Alves da Silva dão outra versão. Afirmam que abordaram “um egresso do sistema prisional” e o liberaram e que, em seguida, outro homem que passava na rua, Hernani, teria gritado “Ô parceiro, está em choque? cola aqui, nós temos o direito de ir e vir”. Os policiais dizem que se aproximaram para tentar abordá-lo, mas Hernani se negou e não permitiu a abordagem.
Depois, ainda na versão dos policiais, Hernani teria fugido gritando “Polícia tudo lixo! Seus vermes parasitas!” e entrou em casa mesmo com os PMs mandando que parasse. Os policiais relataram que se aproximaram e entraram no imovel. Foi aí que vizinhos, revoltados com a invasão à residência, passaram a arremessar objetos como “gaiolas, vasos de plantas, tiojolos, vassouras, dentre outros” contra a equipe. O soldado Ferreira e o cabo Vitor disseram que foram atingidos e que o soldado Assunção conteve Johnny, levando-o para a parte da frente da residência, mas o inspetor mordeu seu dedo anelar da mão direita. O soldado teria tentado contê-lo novamente, mas se desequilibraram no degrau do quintal e caíram. A queda teria levado a lesões e escoriações. O PM afirma que Johnny estava consciente quando foi contido e algemado e conduzido ao Hospital Planalto.
O caso foi registrado como lesão corporal e resistência e tanto os dois irmãos quanto o soldado Vitor aparecem como autores e vítimas. O delegado Fabricio Rizzo Pinheiro entendeu que o caso deve ser melhor apurado devido à “complexidade dos fatos e os diversos relatos das partes envolvidas”.
Márcia Lysllane, articuladora na zona leste da Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio, movimento que denuncia violações de direitos humanos nas periferias, afirma que, tão logo Jhonny tenha o laudo do IML, ele será acompanhado para formalizar uma denúncia na Corregedoria da PM. “Frequentemente as abordagens truculentas por parte da PM ocorrem na região. O corpo negro e pobre da periferia é constantemente criminalizado pela PM”, declarou. “A única arma que temos para nos proteger é o celular”.
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