Pode apertar, mas não vai acender agora

Por Andre Courel (Foto: Renato Rovai)

Pode apertar, mas não vai acender agora

O Supremo Tribunal Federal, em julgamento histórico, descriminalizou o porte de maconha para quem se encontra na condição de usuário, que, conforme a decisão, é a pessoa que porta até 40 gramas ou tem 6 plantas fêmeas.

O julgado, depois de quase duas décadas, põe fim a uma injusta lacuna criada pela Lei de Drogas, que deixava a cargo das autoridades diferenciar usuário e traficante, o que é inconstitucional. Sendo inclusive vedada a analogia, pois no Direito Penal, assim como no jogo do bicho, vale o escrito.

O maior problema de toda legislação malfeita, principalmente a penal, é que as consequências são maiores na mão dos pobres do que dos ricos. Então, se você é encontrado com duas "buchinhas", um isqueiro e 10 "conto" trocado, você é traficante.

Agora, como no filme Tropa de Elite, a jovem, branca e moradora do Leblon, te pegam com 100 gramas, você é usuária, mesmo que "esteja fornecendo para o escritório inteiro". No final, isso se torna combustível na fogueira do crime e atrapalha o já falido combate às drogas.

Quando o Silva entra no sistema, ele se torna mais um número, não é mais humano, sua família é destruída. Então o garoto que nunca havia feito mal a ninguém, que trabalhava para ajudar a mãe, é jogado no covil de criminosos que desde a mais tenra idade vivem entrando e saindo do sistema, os doutores do crime.

Com ele na cadeia, correndo risco de vida, a família sem dinheiro e sem advogado, e sem perspectiva de sair, o crime organizado oferece-lhe a solução para tudo isso. Parabéns ao Estado, formou mais um escravo para o crime organizado. Então, ao invés de termos mais um professor, advogado, médico, um religioso, formamos mais um criminoso.

A menina das 100 gramas foi para a Federal e virou doutora, vai usar toga e quando bater na sua mesa o "flagrante" de outro Silva, vai direto pro sistema, mas a prole de sua amiga do Leblon só vai passar a mão na cabeça e o ciclo se repetirá, até que nós, como sociedade, o encerremos.

A decisão da Suprema Corte foi um enorme passo no debate, mas quem vai "bater o martelo" é o Congresso Nacional, que como no caso da União Estável homoafetiva e tantos outros temas polêmicos, vai se omitir até não poder mais e quando for tomar a decisão, "vai jogar pra galera" e jogar os "maconheiros" na cadeia. Então, parafraseando Bezerra da Silva, "Pode apertar, mas não vai acender agora. Se segura malandro, pra fazer a cabeça tem hora."

Artigo de Opinião

 

 

Por Jornal da República em 27/06/2024
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