Poder aquisitivo, reformas, impostos: os programas de Macron e Le Pen na economia

Poder aquisitivo, reformas, impostos: os programas de Macron e Le Pen na economia

O poder aquisitivo dos franceses é a principal preocupação dos eleitores nesta corrida presidencial – mas está longe de ser o único desafio econômico do próximo líder da França, num contexto delicado de recuperação da pandemia de coronavírus e guerra na Ucrânia. Reforma das aposentadorias, queda de impostos, reindustrialização e relação com a União Europeia são alguns dossiês em que Emmanuel Macron e Marine Le Pen apresentam projetos opostos para o país, embora tenham pontos de convergência. 

A França é um dos países europeus que melhor se restabelece da pandemia, com uma queda regular do desemprego, a 7,4% em março, e uma retomada do crescimento econômico de fazer inveja em 2021 (+7%). A guerra da Ucrânia, entretanto, traz de volta as incertezas e aumenta os preços do custo de vida dos franceses, um reflexo da alta dos preços da energia e produtos de base como combustíveis e alimentos.

“Antes, já tínhamos um problema de logística. O mundo estava se recuperando da covid e recuperando todas as redes de logística, as cadeias de valor, quando chega a guerra e perturba não só essas cadeias, como pode cortar a fonte de matérias-primas para a Europa, já que a Rússia e a Ucrânia são as maiores fornecedoras de muitas delas”, sublinha o professor de Economia Gabriel Gimenez-Roche, da Neoma Business School, de Rouen.

Ambos defendem subvenções contra alta dos preços

Neste contexto, os dois candidatos lançam a cartada das subvenções: Macron ofereceu ajuda financeira direta para os menos favorecidos, congelou os preços da energia e bancou uma redução de até €0,18 do preço do litro do combustíveis, medidas que pretende manter. Sua opositora de extrema direita garante que irá mais longe, se for eleita, aumentando em 10% o salário de quem ganha até três salários mínimos e isentando de encargos sociais empresas e, parcialmente, funcionários. Marine Le Pen também almeja baixar dos atuais 20% para 5,5% a TVA, um imposto sobre valor agregado semelhante ao ICMS brasileiro.

Graças a propostas agradáveis aos ouvidos, mas pesadas para os cofres públicos, Marine Le Pen ampliou a sua influência sobre o eleitorado das classes populares nos últimos anos. Ela sugere, por exemplo, trocar o imposto sobre o patrimônio imobiliário instaurado por Macron por um que recaia sobre a fortuna financeira.

"A Marine Le Pen é mais generosa. Ela parece o Papai Noel, promete muita coisa, como eliminar completamente os encargos sociais das empresas”, observa Gimenez-Roche. "Promete que todos os franceses com menos de 30 anos não pagariam nenhum imposto de renda, independentemente do nível de renda e inclusive empresários. Ou seja, é muito dinheiro sendo prometido, mas ela não explica, por enquanto, como financiar tudo isso."

Reforma da previdência

A estratégia de Macron de pagar "custe o que custar" para a França sofrer menos impacto com a covid-19 teve um preço: o próximo presidente vai herdar um país cuja dívida já ultrapassa 112% do PIB. Não à toa, Macron já anunciou a retomada de um dos seus principais projetos para o primeiro mandato, a reforma da previdência, adiada pelo contexto sanitário.

O atual presidente planeja aumentar de 62 para 65 anos a idade mínima para se aposentar no país. Sua rival, ao contrário, quer restabelecer o prazo para 60 anos para algumas categorias profissionais e manter a idade atual para o restante da população. Gimenez-Roche adverte que uma ampla reforma é crucial para manter o nível atual das pensões.

“Hoje, já são necessários de dois a três ativos para financiar um aposentado. Num futuro próximo, que pode ser já daqui a 10 anos, pode ser um por um. Hoje, para ter a aposentadoria plena na França, é aos 62 anos. Ainda é muito baixo: nos países vizinhos, como na Alemanha, já é 67 anos e, na Espanha, 63”, compara. "Quando você fala com qualquer especialista em previdência, seja de esquerda ou de direita, eles vão estar de acordo que é impossível manter o sistema atual com as mesmas pensões, porque não tem ativos para manter esse sistema”, ressalta o professor da Neoma Business.

Os dois candidatos também se opõem sobre a relação com a União Europeia – enquanto Macron é profundamente europeu, Le Pen sempre foi uma crítica do bloco, do qual prometia separação até a última eleição, em 2017. Agora, a candidata trocou o discurso anti-UE pelo da reforma da sua governança para, segundo ela, impulsionar a reindustrialização da França, sem esconder a pretensão de uma política econômica de viés protecionista. Entretanto, Le Pen teria fraca margem de manobra para enfrentar Bruxelas.

"Por exemplo, ela fala que vai dar preferência nacional para os fornecedores de mercadorias ou serviços para o Estado. Mas isso é proibido na União Europeia”, lembra Gimenez-Roche. "Cada empregado ou empresa de um país membro é considerado igual a um prestador de serviços ou uma empresa do território nacional dos países.” (Do Ópera Mundi)

Por Jornal da República em 14/04/2022
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