Quissamã vive epidemia de assédio e perseguição a moradores que não aceitam a condução política da prefeitura

Reportagem mostra quatro pessoas que perderam empregos ou enfrentam processos por criticarem erros administrativos como a falta de coleta de lixo na porta de suas casas, entre outros. Pedidos de indenização são sempre de R$ 40 mil

Quissamã vive epidemia de assédio e perseguição a moradores que não aceitam a condução política da prefeitura

Imagine receber a visita de um oficial de Justiça comunicando que você está sendo processado por ter feito uma simples postagem reclamando da falta de coleta de lixo na porta de sua casa? Ou ser demitido, com a esposa grávida, porque disse, numa roda de amigos, que votaria num candidato que não era o da situação? Relatos como esses têm se tornado rotina em Quissamã, uma verdadeira epidemia com funcionários públicos e moradores humildes sendo perseguidos por terem uma opção política diferente do grupo que comanda a Prefeitura. A prática, que tipifica o crime de assédio moral, é recorrente e tem sido denunciada na Justiça e nas redes sociais.

“Até hoje estou sem trabalhar, é complicado. Minha cabeça está a mil porque tenho uma filha de nove meses e preciso de emprego para alimentá-la”, conta Ronaldo Conceição, técnico em radiologia que trabalhava no Hospital Municipal de Quissamã quando foi demitido sem justa causa.
 “E o pior, até hoje não recebi meus direitos trabalhistas. O juiz já me deu ganho de causa, mas a empresa e a prefeitura ficam recorrendo. Não sei mais o que fazer”.

O que fazer é a mesma pergunta que se faz a estudante de Nutrição Vithoria Rose, de apenas 20 anos. Há cerca de dois meses ela estava em seu trabalho, no CIEP Brizolão 465 - Dr. Amílcar Pereira da Silva, quando foi chamada para conversar pela direção da empresa. Naquele momento ela estava cuidando de um de seus alunos com TOD (transtorno desafiador opositor, que atua em crianças com autismo e deficiência intelectual, entre outras). “Eu sempre trabalhei para ajudar em casa e agora para pagar a faculdade. De repente me mandam embora do nada. Então entendi que isso aconteceu só porque eu sou filha de uma política que faz oposição à prefeita”, relata ela. 

Sua sensação é de que a prefeitura não é de todos, mas apenas do grupo político que a comanda. Tanto ela quanto Ronaldo têm certeza que existem diversos outros casos iguais aos seus mas que não são revelados porque as pessoas têm medo. Medo que Jovana Azevedo não teve ao denunciar a perseguição que está sofrendo desde que denunciou a falta de coleta de lixo na porta de sua casa, no bairro de Santa Catarina. “A cidade ficou um caos, quem se lembra vai concordar. Eu apenas fui lá e comentei, como cidadã, exercendo meu direito. Até que um dia recebi na minha casa o oficial de Justiça”, recorda. “Eu era cobradora em Macaé e tinha sido demitida, aí fiquei pensando em como eu conseguiria enfrentar esse processo, pagar advogado. Ela me pediu R$ 40 mil de indenização!”. 

Os casos são muitos. Greiciane Santos também passou por situação parecida. Como Jovana, a balconista também estava indignada com a falta da coleta de lixo e usou suas redes sociais para criticar a prefeitura, que deixou de cumprir um dever mínimo do Poder Público. Dias depois, o mesmo susto: em sua casa apareceu um oficial de Justiça comunicando que ela estava sendo processada pela prefeita por conta de sua postagem. “Me intimaram a comparecer no Forum. Fiquei sem chão, porque eu era a única que trabalhava em casa, com meu pai doente, e ela exigindo que meu patrão me demitisse”.

A falta de piedade, e a cobrança dos mesmos R$ 40 mil exigidos de Vithoria Rose, demonstram que há um método neste tipo de ação. Como disse Ronaldo, Quissamã tem medo. Muito medo. “Mas eu gostaria muito de ver Quissamã voltar a ser feliz”, concluiu Greiciane.

 

Por Jornal da República em 04/10/2024
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